Presentemente o termo destralhar é usado de forma frequente. Há quem também aplique o estrangeirismo declutter. Mas afinal do que se trata, e porque é tão falado? Os programas de televisão, documentários, livros e até TED Talks sobre este tema têm vindo a aumentar. Vamos então perceber o porquê.
Comecemos por procurar no dicionário o significado do termo: é o acto de retirar ou desembaraçar-se de tralha ou coisas inúteis. Tudo muito certo, mas será que se resume apenas a esta definição? Não. Se consultarmos a definição dada pela comunidade Clutters Anonymous, tralha é tudo o que não precisamos, queremos ou usamos e que rouba o nosso tempo, energia ou espaço, destruindo o nosso equilíbrio. Na realidade, aprofundando a palavra destralhar compreendemos que há muito a falar. Tralha poderá ser: física, mental, emocional, digital e até espiritual.
Posto isto, podemos dizer que o tema destralhar tem subdivisões, o que o torna demasiado vasto para nos cingirmos a um único artigo. A seu tempo falaremos dos vários tipos de tralha. Neste artigo começamos por falar de tralha física. Curiosamente, este é o tipo de tralha que mais se fala. E é fácil entender que assim seja porque é uma tralha palpável, a qual observamos. É como uma poluição visual, a qual nos traz desconforto e torna os espaços desarmoniosos. Muitos de nós até já teremos ouvido ou verbalizado o comentário “a minha casa está cheia de tralha, preciso dar uma volta às minhas coisas”.
Primeiro que tudo há que entender que tralha está ligada à percepção pessoal. A percepção é uma tomada de conhecimento baseada nos nossos sentidos sobre o que nos rodeia, não sendo transversal a todos os indivíduos. Logo, o que para uma pessoa é considerado tralha para outra poderá não o ser.
Fruto da revolução industrial e consequente aumento de produção de bens, a sociedade foi ficando cada vez mais consumista. Ficou mais fácil aceder e adquirir bens. O excesso de oferta aliado a técnicas de marketing agressivas criou necessidades no Ser Humano. Socialmente a posse de bens transparece o sentimento de felicidade e status económico-social. Esta é uma mistura explosiva para facilmente acumularmos tralhas em casa, fruto de um consumismo de impulso. As compras que fazemos, muitas vezes, são irrefletidas, desadequadas e desnecessárias. Com isto, acabamos por entrar na espiral da acumulação. Sim, porque tralha gera tralha. Pensemos nas caixas ou móveis que compramos para arrumar tralha, ou até nos armazéns de self-storage que oferecem soluções para a falta de espaço nas nossas casas. Esta é a realidade da nossa sociedade.
Apesar de tanto se falar no termo destralhar, existem pessoas que são muito cépticas quanto ao assunto. Quando se entra na espiral de consumo facilmente se cria uma adição. Tudo nos faz falta e se torna indispensável. Existe a necessidade de parar e olhar em nossa volta. Avaliar tudo o que temos. Até assusta pensar em avaliar tudo, porque na realidade é muito e acabamos por fechar os olhos. Só de pensar em abrir um armário cheio de loiça, roupa, produtos de limpeza ou higiene, para muitos é um desafio pela quantidade visualizada. Solução? Voltar a fechar as portas. Como diz o ditado “longe da vista, longe do coração”. Mas será assim? Mais cedo ou mais tarde vai ter de abrir essas portas e, mesmo que não verbalize a ninguém, interiormente muitos pensamentos podem surgir: onde será que coloquei as calças verdes que queria usar amanhã, sei que tinha uma lanterna algures neste móvel, mas não encontro…. Assuma que a situação está a ficar descontrolada e comece a fazer mudanças na sua forma de viver.
Uma mudança é o resultado de uma acção, fruto de uma decisão.
Compreendemos então que destralhar é fruto de uma decisão. Começa com a avaliação de que algo tem de mudar para melhor, que tem de assumir o controlo dos seus bens e não ser controlado por eles. As nossas casas não podem funcionar como armazéns, mas sim serem espaços de vida, de bem-estar, de recarregar de energia, um refúgio da correria da nossa vida, um porto de abrigo. Tenha a coragem de tomar muitas decisões. Poderá ser um processo exaustivo para muitos, mas não desista. Seja resiliente, procure uma motivação estimulante, mantenha o foco e seja disciplinado durante o processo. Faça um plano, atribua-lhe prazos de execução e subdivida as tarefas maiores. Estabeleça também como se quer recompensar por ter cumprido esse seu plano.
Poderá agora perguntar o que ganha com estas acções de destralhe. São muitas as vantagens, acredite.
Num próximo artigo abordaremos as vantagens e regras do destralhe físico. Até breve.